domingo, 10 de novembro de 2019

Godspeed You! Black Emperor no Lisboa Ao Vivo, Lisboa (09-11-2019)

"A noite dos drones apocalípticos"

No dia 9 de Novembro de 2019, fui ao Lisboa Ao Vivo ver os Godspeed You! Black Emperor.
O movimento pós-rock tenha-se desenvolvido produtivamente ao longo do tempo, significando aos vários ouvintes de usar a imaginação, sentir as suas experiências e transmitir as suas sensações. A sonoridade pós-rock parece algo cinemática em toda a natureza. O uso de instrumentos como a guitarra e a bateria, em termos de composição é mais focada na obtenção de texturas, dinâmicas e ambientes na sua forma mais clássica.
Os progenitores Talk Talk, que no inicio de carreira começaram com a new wave nos 1980s, e que anos mais tarde, nunca mais fizeram espectáculos ao vivo e decidiram mudar de caminhos diferentes, durante as gravações nos dois últimos álbuns, lançados entre finais de 1980s e inicio de 1990s antes do fim da banda. As músicas nasceram de horas de improviso, coladas mais tarde usando os equipamentos digitais e o produto final é uma mistura de rock, música clássica, música ambiente, jazz e avant-garde com canções compridas, e que lançou uma semente do sub-género do rock alternativo que se veio a designar de "pós-rock". Esses dois últimos álbuns ("Spirit Of Eden" e "Laughing Stock") não atingiram nenhum sucesso quando saem e que mais tarde acabaram de ser tornar um enorme sucesso de culto e que se inspirou inúmeras bandas como Mogwai, Radiohead (na fase Kid A/Amnesiac), Sigur Rós, Tortoise, Explosions In The Sky, Bark Psychosis (com o facto do crítico de música Simon Reynolds ter usado a esse termo em relação ao álbum "Hex" de 1994) e claro os Godspeed You Black Emperor. A outra banda mais importante desse movimento, os Slint, no seu último álbum "Spiderland", lançado em inicio de 1990s (na mesma altura do lançamento do "Laughing Stock" dos Talk Talk), é mais focado no breve silêncio, nas mudanças de volume, do tempo e das estruturas, incorporando influências do pós-hardcore. Mas voltando ao assunto mais importante.
Os Godspeed, a par dos Sigur Rós e da fase final dos Talk Talk, foram uma das primeiras bandas que me introduziram a esse movimento que desconhecia. O que é que gosto mais das músicas dos Godspeed são a estrutura de canções compridas como se tratassem de pequenas sinfonias, os field recordings, os samples, a construção dos drones de guitarras, o crescendo prolongado das dinâmicas, a mentalidade do noise rock, do punk e da música ambiental, os violinos orquestrais, as camadas de texturas e, claro, os reverbs para dar uma atmosfera concisa. Para além de ser fã dos Godspeed You Black Emperor, também gosto do projecto musical do mentor dos Godspeed, Efrim Manuel Menuck, os A Silver Mt. Zion (ou posso então chamar Thee Silver Mt. Zion Memorial Orchestra).
Com as obras intemporais e sensacionais "F# A# ♾" (1997), "Slow Riot For Zero Kanada EP" (1999), "Lift Your Skinny Fists Like Antennas To Heaven" (2000), "Yanqui U.X.O" (2002) e o regressado "Allelujah! Don't Bend! Ascend!" (2012), os Godspeed You Black Emperor exploram ideias diferentes do que os restantes contemporâneos mencionados. Os samples de vozes, os crescendos de instrumentos em termos de intensidade, field recordings, texturas, noisedrones, experimentações sónicas, segmentos de peças musicais (que nasciam de uma banda sonora para o fim do mundo) e as mensagens muito politizadas, apocalípticas e de criticas sociais nos títulos das canções e nas capas com uma estética "punk". Estes elementos estão muito bem presentes no seu equipamento. Há algum critico de música que eu vi em qualquer site no review do álbum "Lift Your Skinny Fists..." que comparou os Godspeed com uma banda chamada os Swans, na fase "Soundtracks For The Blind", e não refiro aquela fase dos estilos pós-punk, noise, rock gótico, neofolk e industrial deles. Quanto a mim, eu não acho que os Godspeed soassem a Swans, eles incorporam as influências dos Swans para uma sonoridade algo completamente ambiciosa sem copiar ao que Swans tinham nascido no álbum "Soundtracks For The Blind", cada um tem um estilo diferente do que é habitual.
Lembro-me quando os Godspeed vieram cá pela última vez no NOS Primavera Sound 2014 e não tive oportunidade de os ver, porque tocaram à mesma hora da actuação dos Pixies em diferentes palcos. O álbum mais recente editado em 2017, "Luciferian Towers", embora não sendo tão majestoso como os primeiros quatro álbuns e um EP, os Godspeed conseguiram compor peças musicais com clareza em termos de texturas e de dinâmicas e pareceu-me muito melhor do que o anterior "Asunder, Sweet and Other Distress", do qual achei um bocadinho decepcionante devido à secção dos drones inacabada no meio, e por isso é que eles irão apresentar alguns dos temas do "Luciferian Towers" ao vivo. E então, com uma expectativa muito elevada, decidi ver os Godspeed no Lisboa Ao Vivo.
Mas antes disso, estive a ver uma banda chamada Light Conductor, que fizeram a primeira parte do concerto dos Godspeed.
Eu estava perto da porta de entrada quando os Light Conductor começaram às 20h30, pois houve uma enorme fila de espera. Quando entrei, já estava quase a acabar, só apanhei nos últimos 20 minutos. E foi pela primeira vez que os vi e gostei. As músicas deles servem para a construção dos drones prolongados nas teclas e nas guitarras em cada peça musical e só nos últimos 5 minutos de canção ouvem-se os ritmos electrónicos e da harmonia das vozes sussurradas com guitarras distorcidas por parte dos três membros da banda.
Quanto aos Godspeed You Black Emperor, que começaram às 21h30, nem consigo descrever os adjectivos de como me senti emocionado em que eles deram um concerto totalmente magistral no Lisboa Ao Vivo.
No palco estava o Efrim Manuel Menuck (na guitarra e nos tape recordings), Mauro Pezzente (no baixo), Mike Moya (na guitarra), Thierry Amar (no violoncelo e guitarra baixo), David Bryant (na guitarra e nos tape recordings), Sophie Trudeau (no violino), Aidan Girt (na bateria e percussão) e Timothy Herzog (na bateria e percussão). Acompanhando os dois realizadores (Karl Lemieux e Philippe Leonard) que fazem as projecções de imagens.
No entanto, acolhemos as secções emocionantes dos drones do violino e do violoncelo de Trudeau e Amar na primeira parte dramática e discreta do inédito "Hope" que me fazem antecipar do que vêm a seguir. Prosseguindo lentamente às guitarras cintilantes e tons fantasmagóricos que emocionam aos vários espectadores do que estão a sentir. E na segunda parte desta peça, a intensidade da dinâmica acrescenta progressivamente às camadas de texturas de instrumentos ao mais barulhento possível. Os Godspeed conseguem interligar as partes mais calmas com as partes mais barulhentas às dinâmicas por cada peça de uma forma mais detalhada. É como se tivéssemos a reparar os símbolos do tipo Yin e Yang, ou do tipo "luz e sombra". De seguida, "Bosses Hang", no "Luciferian Towers", interliga-se as três partes de um determinado suite, como os vários compositores de música erudita fazem. Vimos a cenografia de fundo das imagens de arranha céus em construção ao longo da música. Na primeira parte ouvimos o trio de guitarras fulgurantes do Menuck, do Bryant e do Moya, bem como na dinâmica secção rítmica fantástica do duo Girt e Herzog tocadas em compasso ternário. Na segunda parte, a intensidade muda-se para a parte mais calma, o uso de acordes bonitos de guitarras onde a melodia é dominante pela delicada secção de violinos da Trudeau. Na terceira a dinâmica e a tensão acrescenta encaixando os rasgos de guitarra, ritmos frenéticos e de violinos melódicos e no fim volta de onde foi iniciado, uma espécie de reprise da primeira parte. Um momento memorável do alinhamento. Outro tema inédito "Glacier", atinge-se o mesmo efeito do que a canção anterior mas de uma forma arrojada. Mas no verdadeiro momento imprescindível para mim foi a outra peça musical de três partes "Anthem For No State", no mesmo álbum mencionado, com uma introdução ambiental temperada de guitarras atmosféricas, cordas misteriosas e na última secção prolongada foi a melhor parte desta secção. Com aquelas belas cordas de violino, secções de guitarras, de bateria e de percussão extraordinárias tanto nas camadas de texturas como nas experimentações acompanhando as imagens de fundo de motins, manifestações e bombeiros voluntários a combater incêndios. De todos esses elementos fazem dos Godspeed um papel crucial da festa da noite. Outro inédito, "Cliff" é tão maravilhoso que me faz lembrar da sonoridade das obras intemporais ao que os Godspeed fizeram, acompanhando as imagens de fundo de corrupções políticas.
No fim do concerto, tocaram na integra o EP "Slow Riot For Zero Kanada", os dois mais prolongados "Moya" e "BBF3" (referência ao Blaise Bailey Finnegan III, que cantou com os Iron Maiden, num período incompreendido deles em finais de 1990s). A minha felicidade atingiu-me ao nível acima do normal durante a interpretação do tema "Moya", desde a secção fantasmagórica e belíssima de violinos e violoncelos a cargo de Trudeau e Amar na introdução. Passando pelos acordes cintilantes de guitarras e de xilofone de metal delicado. Prosseguindo às minhas partes mais favoritas de todo sempre com as melodias super memoráveis, ouvindo-se os belos riffs de guitarra e de violino, os crescendos, às camadas de texturas e a intensidade da música para dar a esse efeito dramático. Na última "BBF3" é uma espécie de continuação com o tema anterior mas ainda mais dramático, ouvindo o sample da voz do próprio Blaze Bailey a falar e demonstrando a cenografia de fundo das imagens de cocktails molotov, brutalidade policial e cidade em chamas. Na última secção, prossegue à mentalidade do punk e do noise rock com um fim muito, mas muito prolongado de rasgos de guitarras e de drones recheados de loops como se fosse símbolo do infinito. Isso faz sentido, a meu ver, porque é que chamaram o álbum de estreia "F# A# (infinity)". Ambos perfeitos momentos da noite com um valor atingido a 10 pontos espalhados por uma multidão cheia e completamente calorosa no Lisboa Ao Vivo.
No entanto, estiveram muito bem dispostos durante a apresentação no palco sem nenhuma falha e mantiveram a grande comunhão com o público.
São 7 músicas prolongadas no total de quase 2 horas, o resultado final alcançou o objectivo. E pronto, foi um concerto totalmente esplendoroso dos maiores génios do pós-rock. E a recepção do público, como eu, foi igualmente caloroso no Lisboa Ao Vivo. Espero que voltem daqui a um ano ou dois.
Godspeed You! Fellow People...


Light Conductor




Godspeed You! Black Emperor










Photos by: Pedro Miguel Dias
Text by: Pedro Miguel Dias
Setlist: https://www.setlist.fm/setlist/godspeed-you-black-emperor/2019/lisboa-ao-vivo-lisbon-portugal-639d56cb.html

Hope Drone
Bosses Hang
Glacier
Anthem For No State
Cliff
Moya
BBF3

Sem comentários:

Enviar um comentário